Crítica | Deadpool

Deadpool é o filme que os fãs queriam

deadpool-gallery-03-gallery-imageAviso: O texto abaixo contém spoilers, leia por sua conta em risco.

Finalmente, mais de um mês depois de ter estreado nos cinemas, consegui ver Deadpool. E olha, tenho que tirar meu chapéu pra FOX e para o Ryan Reynolds. O filme é do caralho! É exatamente aquilo que todo fã do personagem queria ver. É desbocado, violento, engraçado, com cenas de sexo e nudez aos montes. Sabe a tal quebra da quarta parede? Aqueles momentos em que o Deadpool conversa com o leitor da HQ, ou age como se soubesse que está dentro de uma história em quadrinhos? Tá lá também.  O personagem tem plena consciência de que está em um filme e dialoga com o espectador o tempo todo.

Ryan Reynolds nasceu para esse papel. Esqueçam aquela abominação que apareceu em X-Men Origens: Wolverine, e que tem sua devida alfinetada aqui. Reynolds, que é um puta ator carismático, não só se redimiu por aquela atrocidade e pela cagada que também foi Lanterna Verde, como carrega o filme nas costas. Se fora das telas o ator se empenhou ao máximo para tirar Deadpool do papel, e atuou ativamente na divulgação, vestindo a roupa do personagem e aparecendo em uma dúzia de comerciais hilários para a campanha de marketing do longa, dentro das telas exibe um timing cômico excelente. O cara parece uma metralhadora disparando piadas e indiretas para tudo o que é lado. E o melhor de tudo, sem o menor filtro. Não há espaço para moralismo aqui. O excesso de palavrões pode parecer gratuito para alguns, mas esse espírito zombeteiro desbocado é uma das marcas registradas do personagem. Aliás, como é bom ver a liberdade que se consegue com uma classificação indicativa mais alta. Dos palavrões à quantidade de sangue que se vê na tela não resta dúvida do por que um filme do mercenário tagarela só funcionaria com um Rated R (ainda que isso não tivesse impedido alguns pais de entrarem com crianças pequenas na sessão que eu fui).

Deadpool (Ryan Reynolds) reacts to Colossus’ (voiced by Stefan Kapicic) threats.Mas eu tenho que ser sincero, eu estaria mentindo se dissesse que não esperava um pouquinho mais do filme. Não me entendam mal, eu gostei. Muito. A ação é decente, tem piadas para todos os gostos, boas e ruins, mas mesmo mantendo fielmente a essência do personagem nas HQs, o filme é bem menos despirocado do que achei que seria.

As cenas de ação, por exemplo, são boas, não economizam no sangue, exploram bem a comicidade do personagem e tal, mas elas são poucas. Tem ali entre um flashback e outro uma montagem violenta e bem divertida, mostrando o Deadpool indo atrás dos capangas do vilão Ajax (Ed Skrein), mas resumindo: o filme tem apenas duas grandes cenas de ação de fato. A primeira delas é uma extensão daquele vídeo teste que vazou uns anos atrás e que motivou a campanha dos fãs pelo filme. Ela obviamente tá bem mais completa aqui, e tem uma sacada legal de intercala-la com os flashbacks de origem do personagem, o que já quebra um pouco dos clichês do gênero de contar burocraticamente como o herói ganhou seus poderes até o eventual conflito final. Só que todo esse ato toma conta basicamente de toda a primeira hora do filme. Esse recurso até que funciona bem – o próprio Deadpool até brinca com isso quando diz que agora já estamos atualizados na história –, assim como a luta final, que apesar dos exageros pirotécnicos é divertidíssima, mas acabam sendo curtas demais. É quase como se filme fosse construindo uma expectativa, preparando o terreno, aí quando você se ajeita na cadeira e pensa “agora vai”, ele acaba. Eu realmente senti falta de uma cena mais surtada, algo do tipo daquela cena da igreja em Kingsman. Não que isso tire o mérito do que a FOX se permitiu fazer aqui, ou que eu não tenha gostado do resultado, que convenhamos para o modesto orçamento de US$ 58 milhões está de parabéns. Apenas fiquei com a sensação de que o filme entregaria algo a mais. A própria loucura do personagem parece bem mais comedida.

Nas HQs Wade Wilson chega a beirar a esquizofrenia, mas no filme ele parece bem mais estável. Ou quase na maior parte do tempo. Verdade seja dita, ainda que poucos, há uns momentos realmente inspirados de loucura, como a cena em que ele corta a própria mão para escapar do Colossus, e já no final quando após levar uma facada na cabeça ele começa a alucinar e ver desenhos animados em volta de Vanessa (Morena Baccarin).

Deadpool-Exclusive-Set-Photo-Ryan-Reynolds-Gina-Carano-Ed-SkreinEu particularmente gostaria de ter visto mais do anti-herói atuando como mercenário, mas o roteiro é extremamente competente ao usar alguns clichês dos filmes de heróis de forma bem humorada. Digo clichês, porque a piada que o marketing fazia do filme no fundo ser sobre uma história de amor não é tão inverdade assim. O romance, ainda que totalmente tresloucado, tem um papel importante na trama. Na verdade, ele é o grande combustível da história toda. É por conta do amor por Vanessa que Wade se submete ao experimento que lhe confere seus poderes mutantes, e é para poder recuperar sua aparência e poder voltar para ela que ele parte numa cruzada atrás do vilão do filme. Nada disso na verdade chega a ser um demérito, até porque o filme consegue muito bem usar essas situações manjadas a seu favor, fazendo piadas sobre esses momentos e subverter muito do que vimos no gênero até hoje. O que mais pode ser dito de um personagem que aceita fazer sexo anal, sendo o “passivo” da história, como forma de agradar a namorada no Dia das Mulheres?

Deadpool-Ryan-Reynolds-Morena-BaccarinIsso tudo foi só para deixar claro que sim, o filme tem lá seus defeitos. Até o maior dos fanboys consegue perceber. Mas quer saber? Ele é um puta presente para os fãs. Dava para ser melhor? Dava, com certeza. Mas depois da cagada que fizeram com o mercenário tagarela no primeiro filme solo do Wolverine, e com o pouco orçamento que tinham em mãos, Deadpool é praticamente um milagre. Foi uma aposta arriscada que deu certo.
O diretor estreante Tim Miller faz o melhor possível com os recursos que tem, e mesmo que não reinvente a roda, dá uma sacudida na fórmula. Só a tirada de sarro dos créditos iniciais já é prova suficiente disso. Além de dar o tom do filme, está lá pau a pau com a abertura de Watchmen, como uma das melhores em um filme de herói.

deadpool-gallery-07-gallery-imageE PUTA QUE PARIU! Os uniformes estão simplesmente incríveis. A ideia de animar o movimento dos olhos do personagem dando-lhe mais expressões faciais é ótima, mas ver uma das melhores adaptações do traje dos X-Men na tela do cinema não tem preço. A hora em que a Míssil Megasônico Adolescente (Brianna Hildebrand) aparece trajando uma variação do clássico collant azul e amarelo da equipe mutante, o nerd em mim vibrou de alegria. Porra, Fox! Custa alguma coisa fazer os outros X-Men usarem algo assim também?

A inserção da personagem e do Colossus na história é muito boa por sinal. As piadas com os X-Men e sua bagunçada cronologia nos cinemas é ótima, e o momento em que o Deadpool aparece na Mansão X e zoa com o fato do filme não poder bancar a aparição de outros mutantes na trama é impagável. Mas o que eu mais gostei é como os dois personagens por si só são engraçados e até bem construídos. O Colussus está muito mais fiel as HQs do que as versões que vimos nos filmes do Singer até agora. Tanto em aparência quanto em personalidade. A luta entre o grandalhão e a vilã, Angel Dust, da Gina Carano é hilária, e o Capitão América ficaria orgulhoso de sua polidez. Já a Míssil rouba a cena legal do filme pra mim. Além do visual perfeito, a química da personagem da pouco conhecida Brianna Hildebrand com o anti-herói Deadpool é ouro puro. A presença da dupla no longa também marca o primeiro passo da FOX na criação de seu próprio universo compartilhado nos cinemas. Escrevam o que estou dizendo, espere em breve novidades no filme da X-Force e dos Novos Mutantes.

deadpool-SYB_2040_v076.1040_rgbSe o comprometimento do Ryan Reynolds com o papel é realmente algo lindo de se ver, com o ator passando mais da metade do filme de máscara, sua atuação nas horas mais densas do filme também não deixa a desejar. Na hora em que Wade descobre sobre o câncer em estado terminal, Reynolds consegue demonstrar a vulnerabilidade do personagem simplesmente com o olhar perdido, e até emociona de verdade. As torturas a que ele é submetido durante o experimento que lhe dá seus poderes – que, aliás, nem sequer menciona o envolvimento do projeto Arma X – é surpreendentemente angustiante, e o ator convence em todas as cenas.

Convincente também é a química entre Reynolds e Morena Baccarin. Eu comprei de imediato o romance entre Wade e Vanessa. Da disputa pra ver quem teve a pior infância às tórridas cenas de sexo, com direito as mais variadas posições sexuais, nada soa artificial. O elenco de apoio todo na verdade funciona bem. A relação com o amigo Weasel (T.J. Miller) é legal. A personagem de Leslie Uggams, a Al Cega acrescenta pouco a história em si, mas tem ótimas tiradas. E claro, tem o impagável Dopinder (Karan Soni), um taxista que acaba servindo como uma espécie de sidekick para o mercenário, roubando a cena e rendendo alguns dos momentos mais engraçados do filme.

deadpool-gallery-01-gallery-imageParticularmente, eu acho que Deadpool está de longe de ser o melhor filme de super-herói já feito, ou aquele que será responsável por revolucionar o gênero nos cinemas como vi muita gente dizendo por aí, mas é com certeza um dos filmes baseado em quadrinhos mais divertidos e irreverentes destinado a um público mais adulto em muito tempo. O filme é honesto, sabe exatamente o que é, e o que os fãs querem ver, e não tenta ser mais do que isso. Poderia ter ousado um pouco mais aqui e acolá, mas whatever… O filme cumpre o que prometeu. O que vemos na tela é o Deadpool dos quadrinhos e ponto final. Tem ação, humor, violência e um monte de referências às HQs e à cultura pop para tudo o que é lado, capaz de fazer sorrir até mesmo o mais rabugento dos nerds. Referências essas que pra mim funcionam bem melhor para a galera mais velha mesmo, já que não estou muito certo do quanto piadas com a Sinéad O’Connor, Wham! e “Digam o Que Quiserem” funcionam com a geração YouTube.

deadpool-gallery-06-gallery-imageDepois do reboot do Quarteto Fantástico naufragar, parece que FOX conseguiu limpar sua barra com a galera, e tem agora a faca e o queijo na mão. O filme já se pagou, e continua batendo recorde de bilheteria, atualmente somando mais de US$ 683 mundialmente. Um feito e tanto para um filme de US$ 58 milhões e com a restrição de idade que tem. Dado o sucesso do longa, o estúdio já anunciou uma continuação e confirmou que o terceiro filme do Wolverine também terá uma classificação indicativa mais restrita (obrigado, senhor!), e provavelmente se baseará no arco Velho Logan. Tudo graças ao mercenário tagarela. Nada mal para um personagem que começou como uma sátira ao Exterminador da DC, hein?

O Cable já foi confirmado para o próximo filme, numa das melhores cenas pós-crédito em um filme da Marvel (Ah, tem como não amar uma referência a Curtindo A Vida Adoidado?). Resta agora esperar que anunciem também a Dominó na sequência para a alegria ser completa.

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